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25 Agosto, 2023

Crias dos dois únicos casais de abutre-preto do Douro Internacional já saíram do ninho e exploram o território

Crias dos dois únicos casais de abutre-preto do Douro Internacional já saíram do ninho e exploram o território

Cria de abutre-preto no ninho. Fotografia Palombar.

Os dois únicos casais de abutre-preto (Aegypius monachus) conhecidos a reproduzirem-se na colónia do Parque Natural do Douro Internacional (PNDI) tiveram crias bem-sucedidas este ano e estas já saíram dos ninhos e exploram o território. É o que revelam os dados da monitorização da época de reprodução desta espécie ameaçada de extinção em Portugal realizada no âmbito do projeto “LIFE Aegypius Return - consolidação e expansão da população de abutre-preto em Portugal e no oeste de Espanha”. Foi ainda registada a construção de um terceiro ninho da espécie no Douro Internacional, mas que acabou por ser abandonado pelo casal de abutres-pretos.

Em Portugal, existem apenas quatro colónias reprodutoras de abutre-preto: no Douro Internacional, na Serra da Malcata, no Tejo Internacional e na Herdade da Contenda, sendo a primeira a mais pequena e frágil. Entre janeiro e agosto deste ano, a equipa da organização não governamental de ambiente Palombar - Conservação da Natureza e do Património Rural, em colaboração com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), esteve no terreno a realizar a monitorização da época de reprodução desta espécie no PNDI, uma ação fundamental para avaliar o seu sucesso reprodutor e tendência populacional.

Monitorização é feita com rigor e segurança

Numa primeira fase, para evitar qualquer tipo de perturbação aos casais de abutre-preto no período mais crítico da reprodução, a monitorização foi realizada à distância, com recurso a equipamento ótico, como telescópico e binóculos. Posteriormente, quando os técnicos especializados consideraram ser o momento adequado e seguro para os progenitores e crias, foi feita uma incursão aos ninhos para realizar uma avaliação biométrica das crias, como o tamanho da asa e do bico, e recolher amostras biológicas, nomeadamente de sangue, que permitem analisar as características da ave e o seu estado sanitário. As aves foram também anilhadas e equipadas com dispositivo GPS, que permite a sua monitorização à distância. A equipa do projeto está agora a realizar o seguimento continuado das crias, a partir dos dados fornecidos pelo GPS, para obter informações essenciais para a sua conservação, nomeadamente sobre os seus movimentos, comportamento, longevidade, ameaças e dieta.


Monitorização dos ninhos. Fotografia Palombar.


Onde nidifica esta espécie?


Ao contrário da maioria dos abutres, que nidificam em acantilados rochosos em montanhas e arribas, o abutre-preto normalmente constrói o seu ninho em árvores de grande porte. É o caso dos dois casais que nidificam no Douro Internacional. Ambos contruíram os seus ninhos em zimbros (Juniperus oxycedrus). Em homenagem a este comportamento da espécie, as duas crias nascidas este ano receberam os nomes de árvores nativas da região: Freixo e Juniperus.

O abutre-preto extinguiu-se como nidificante em Portugal no início da década de 70. Só em 2010 voltou a nidificar em Portugal, no Parque Natural do Tejo Internacional. O Douro Internacional acolhe a colónia mais recente e delicada desta espécie, foi em 2012 que se registou o primeiro casal nidificante e, em 2019, o segundo. Este ano, na primavera, a equipa da Palombar e do ICNF observou a construção de um terceiro ninho e comportamentos de incubação por parte de um terceiro casal. Contudo, posteriormente, verificou-se que o casal - provavelmente jovem - terminou por abandonar o ninho e não teve êxito na reprodução este ano, mas no próximo poderá haver uma nova tentativa.

Saída do ninho é um período crítico

Depois de mais de 100 dias no ninho a receber os cuidados dos progenitores, as crias de abutre-preto avançaram agora para um momento decisivo: a saída do local seguro onde nasceram. Este é um momento crítico, pois a ave inexperiente fará os seus primeiros voos à descoberta do território e a procura de alimento. Nesta fase, as ameaças a que está sujeita são muitas, como queda, que pode provocar a morte ou fraturas, dificuldade em voar, ataque de outras aves, restrição alimentar, entre outras.

Iván Gutiérrez, biólogo da Palombar responsável pela monitorização da espécie na colónia do Douro Internacional, explica que este "é um período muito vulnerável, pois os progenitores começam a estar menos presentes, e, nos dias de muito calor, a cria pode saltar do ninho e cair no solo, onde, por vezes, não sobrevive. Por outro lado, as crias que já começam a sair do ninho para explorar e procurar alimento sozinhas têm associado um maior risco, pois são animais ainda inexperientes".


Casal de abutre-preto com cria no ninho. Fotografia Palombar.


Por onde andam as crias de abutre-preto?


Até ao momento, as informações fornecidas pelos dispositivos GPS colocados nas crias indicam que estas já saíram dos ninhos e estão a explorar o território nas zonas ao redor do local de nascimento, sem ainda realizar voos de média e longa distância. O ninho continua a ser um porto seguro, para onde voltam após sobrevoarem a região. Na Europa, o abutre-preto habitualmente não é uma ave migratória, mas sim sedentária, e permanece no território onde nasce. Contudo, alguns juvenis da espécie podem migrar para locais distantes, como para outras zonas do continente europeu, ou para o continente africano, embora não seja comum.

Sucesso reprodutor deve ser avaliado a longo prazo

A avaliação do sucesso reprodutor desta espécie, que só tem uma cria por casal a cada ano, deve ser realizada a longo prazo. “Uma coisa é o número de casais reprodutores e de crias nascidas, e outra é o número de crias que conseguem sair do ninho e sobreviver de forma autónoma”, sublinha Iván Gutiérrez. É por isso fundamental monitorizar, através dos dispositivos GPS, as crias nascidas a cada ano a longo prazo para perceber se estas efetivamente conseguirão sobreviver e chegar à idade adulta, aumentando a colónia da espécie.

As colónias com número reduzido de casais, como é o caso da do Douro Internacional, são mais suscetíveis de desaparecer devido a alguma perturbação ou ameaça, como são os incêndios florestais. Em 2017, por exemplo, a colónia do PNDI foi afetada por um incêndio florestal que destruiu o único ninho da espécie existente nessa altura, matando a cria de abutre-preto. Para reduzir este tipo de ameaças, o projeto LIFE Aegypius Return também tem previstas ações que visam aumentar a resiliência natural frente aos incêndios florestais nas áreas onde a espécie se reproduz.


Abutre-preto com dispositivo GPS. Fotografia Palombar.


Até 2027, projeto quer devolver à natureza na área do Douro Internacional 20 abutres-pretos


Com o objetivo de aumentar a colónia de abutres-pretos no Douro Internacional, o projeto prevê ainda, até 2027, devolver à natureza nesta área 20 abutres-pretos provenientes de centros de recuperação de fauna selvagem. Neste âmbito, está a ser construída uma estrutura de aclimatação na zona da colónia. Nesta estrutura de grandes dimensões e com todas as condições de segurança, os indivíduos da espécie recuperados irão passar por um período de readaptação ao meio natural e de habituação à região para que a sua fixação nesta colónia, depois da devolução à natureza, seja facilitada. Até ao momento, o projeto já devolveu dois abutres-pretos à natureza no Douro Internacional.

Sobre o projeto

O projeto LIFE Aegypius return arrancou em setembro de 2022 e tem como objetivos principais aumentar a população de abutre-preto e melhorar o seu estado de conservação em Portugal. Pretende, num prazo de seis anos (2022-2027), duplicar a sua população reprodutora em Portugal para que passe dos atuais 40 casais reprodutores, para 80, bem como aumentar as colónias de quatro para cinco.

Este projeto é desenvolvido por um consórcio que integra as seguintes entidades: Vulture Conservation Foundation - organização coordenadora do projeto -, Palombar - Conservação da Natureza e do Património Rural, Herdade da Contenda, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, Liga para a Proteção da Natureza, Associação Transumância e Natureza, Fundación Naturaleza y Hombre, Guarda Nacional Republicana e Associação Nacional de Proprietários Rurais, Gestão Cinegética e Biodiversidade. Tem financiamento de 75% do Programa LIFE da União Europeia e cofinanciamento da Viridia – Conservation in Action e pela MAVA – Foundation pour la Nature.